domingo, 27 de maio de 2012

À MINHA IRMÃ

Era linda.
Sempre chamou atenção pela beleza. Beleza clássica, incomum.
Mas era triste, de uma tristeza que doía em quem a conhecia.
Nunca soube o que fazer da vida, não aprendeu a ser.
Era grande, alta e larga, e tão pequena, desprotegida.
Tentava não ocupar espaço, tentava ser invisível.
Não queria contaminar os outros com sua dor.
Dor existencial, dor de tanta solidão.
Amava tudo, amava todos, não escolhia, amava.
Se foi amada, nunca soube, nunca ouviu.
Era generosa, doava-se, talvez na intenção de sair de si, de viver no outro.
Ria e se escondia no riso, forçava felicidade.
Gostava de sair, esperando esbarrar em possibilidades, pequenas que fossem.
Fantasiava com essa vida emprestada.
-Quando eu for..., quando eu tiver..., quando eu puder..., e outros quandos que nunca vieram.
Nunca, foi seu quando.
Atava-se às filhas prá não ficar à deriva.
Dava todo seu amor estocado à elas, à neta, aos amigos, à família.
Perdia sua identidade, mesclava-se, sumia.
Tinha essa beleza triste, sofrida, machucada por tanto nada que teve.
Seus olhos mostravam a descrença, poucas vezes brilharam.
Perdeu tempo, contando os dias.
Perdeu dias, contando as horas de inquietação.
Perdeu horas tentando entender onde estava seu erro.
E seu erro era não acreditar que merecia ser feliz.
Era, essencialmente boa, uma bondade que chegava a incomodar.
Acreditava em tudo e a todos perdoava, herança paterna.
Carregava-se como um fardo, pesava-lhe existir.
Se despediu da vida assim que nasceu, nenhum mistério nisso, nos dirigimos à morte desde que saímos do ventre materno.
Mas tentamos sobreviver com planos, metas, sonhos. Ela, não.
Fingia com seus "quando" que estava presente à vida.
Tinha uma melancolia atávica, entranhada em seu DNA.
E de dor em dor, dia após dia, esperou.
Esperou o amor, o abraço, o aconchego, esperou o sentido de sua vida.
E a vida passou por ela sem notar sua presença.



Nenhum comentário:

Postar um comentário