quarta-feira, 18 de maio de 2011

SALVE, RAUL

Provocada pelo blog de minha amiga Gotty, entrei na pilha que ela coloca: escrever sobre o que gosto e o que não gosto.
Bem, meu gosto foi mudando através dos séculos vividos, foi sendo apurado, desviado, trocado.
Mas acho que o propósito é falar sobre o gostar ou não gostar, hoje. Amanhã pode ser diferente, quem sabe?
Hoje, gosto de caminhar.
Ler.
Viajar.
Beijar, na boca de preferência. Beijo bem dado, é claro.
Vagabundear com amigos.
Jogar conversa fora.
Sexo muito bem feito, sem pressa.
Cachorros. Mas, confesso, já gostei mais.
Pipoca.
Sorvete de abacaxi.
Dormir quando o sono chega.
Acordar quando o sono acaba.
Frio.
Roupa confortável.
Banho quente.
Casa limpa e arrumada.
Armários organizados.
Perfume suave, em mim e na casa.
Velas.
Beatles.
Rock.
Dirigir em estrada.
Vento.
Céu estrelado.
Arco-íris.
Cajá-manga.
Gargalhada.
Estar só.
Aos poucos, vou lembrando de mais coisinhas que me fazem bem, mas, por enquanto, fico por aqui.
Agora, algumas que não gosto.
Barulho.
Sujeira.
Dependência, qualquer uma.
Cozinha e tudo que diz respeito à ela.
Pessoa carente.
Fofoca.
Depressão por perto.
Engarrafamento.
Beijo mal dado.
Sexo egoísta.
Fim de semana.
Chatos.
Gatos.
Répteis.
Maxixe, o legume.
Comida japonesa.
Despertador.
Roupa nova.
Banho frio.
Verão.
Axé, pagode, funk e afins.
Relâmpagos e trovões, mesmo sendo filha de Iansã.
Multidão.
Falsidade.
Covardia.
Vítima.
Puxa-saco.
Também, nesse caso, deixei de fora outras coisinhas.
É uma lista infindável, pensando bem.
Se sentir necessidade, volto e vou adicionando ou retirando itens.
Essa lista é o retrato do momento, resumidamente.
Mas gostar ou não gostar tem muito de amadurecimento, de entendimento, de experiência.
Talvez a próxima listagem seja completamente diferente, Raul Seixas já dizia:" prefiro ser essa metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo".
Eu, também, Raul, eu, também.

terça-feira, 17 de maio de 2011

REVANCHE

Olhe pra mim, com muita atenção.
Pensa que vou deixar você me derrubar?
Acha que pode me atrair e repelir quando quiser?
Por que se reaproximou, me reconquistou e me negou?
Poder? Vingança?
O que passava pela sua cabeça quando pretendeu me fisgar?
Quando nos afastamos, quando me afastei, tinha motivos que não importam agora.
Sei que você foi ferido, machucado, sei que é difícil ser deixado sem explicação.
Mas faz tanto tempo que achei que havia superado, que havia esquecido.
Aparentemente, não.
Vingança é um prato que se come frio. Você soube esperar e volta à minha vida pra se vingar.
Tenta me pegar em um momento em que me encontro frágil, carente.
Quer me submeter a um sentimento que eu havia sublimado.
Sente que, ainda, gosto de você e tenta reacender a chama latente.
E quando me disponho a me entregar, me afasta.
Nesse vai e volta, vira e revira, se revela e me revolta.
Queria entender, por que me puxa pra si e me mostra o desprezo que sente por mim?
Só posso enxergar o troco guardado por anos.
Mas saiba que, agindo assim, você não sai vitorioso.
Saio ferida, nocauteada, procurando as cordas pra me apoiar e não cair.
Você levanta os braços, comemora a vitória e me olha com raiva.
Mas não é raiva o que sente por mim, é amor decepcionado.
No ringue que você armou, na luta que você arquitetou, no soco bem desferido em que você colocou todo o passado, ainda sou quem você quer.
Por que você não ganhou? Não percebeu?
Porque eu era o que você mais desejava na vida e, com seu movimento de vingança, conseguiu destruir, pra sempre, a possibilidade de estarmos, novamente, juntos.
Esperei por você, construi um caminho que me levaria de volta a nós, você percebia e estimulava.
Nos reencontramos, nos reaproximamos, nos dissemos o que vivemos sem nós, derramamos o sentimento por tantos anos guardado e, feito isso, você me tratou como uma qualquer que cruzou seu caminho. Me destratou, me anulou e, de novo, me perdeu.
Burro, não entendeu que a vida nos deu a última chance de realizarmos o que deixamos passar?
Que ela nos deu a possibilidade de reescrevermos nossa história? Que poderíamos ter um final mais feliz?
Sua revanche deveria ter sido a de me ter e me mostrar a felicidade que, por tanto tempo, não tive. Minha punição seria mais amarga, sendo feliz com você. Mas o gosto amargo que você manteve no canto da boca, fez com que me rejeitasse, não percebendo que estava decretando a sua infelicidade, também.  
Eu sabia  que te amava, desde sempre eu soube. Acontece que, quando jovens, acreditamos que outros amores virão e serão maiores do que aquele que deixamos. Pode acontecer.
Mas, no nosso caso, nenhum foi maior ou mais forte, a ponto de esquecermos.
Lembrei de você em cada dia de minha vida, e quando tentava esquecer, ainda assim, lembrava.
Sinto que o mesmo aconteceu com você, mas sua sede de vingança, seu ego ferido, sua paixão não consumida, tudo junto, fez de você o punhal que estraçalhou nossas vidas.
Como pode não perceber que, dessa vez, não há volta? Você fechou todas as portas, lacrou pra sempre a esperança de sermos felizes.
Não sei o que é felicidade, nunca fui, inteiramente, feliz. Mas não sei ser infeliz, sequer estar infeliz. Não me detenho no sofrimento, encaro, engulo, digiro e sigo. A vida ensina que não há tempo a perder com questões existenciais. Sobreviver é mais importante.
A vida há de continuar sem você, não vou morrer, sequer chorar o leite que você derramou.
Já estou ciente de mim, do que sou e do que quero. Mas, se não posso ter o quero, transformo o meu querer.
Não te odeio, não te quero mal e sei que você se machucou, me ferindo.
Vou olhar pra frente, sem você no meu horizonte.
Mas, por favor, olhe bem pra mim, agora.
Guarde minha imagem na sua retina, grave esse instante em sua memória.
Vou te amar pra sempre, sem você.
Você vai lamentar, enquanto viver, o amor que destruiu porque não soube o que fazer quando o teve, de novo, nas mãos.
Tomara que a vida te dê alguma compreensão do que fez.
Rezo pra que você me esqueça e não sofra.
Te amo. Adeus.

terça-feira, 10 de maio de 2011

DIAMÃETE

Dia das Mães.
Atrasada, como sempre, escrevo sobre essa data.
Penso nessa responsabilidade escolhida e, algumas vezes, delegada.
Fui aluna nessa escola, continuo sendo, no nível superior.
Filhas adultas elevam o nível de dificuldade.
Quando engravidei, fiquei apavorada e feliz, não sei qual sentimento predominava.
Pra começar, achava que não conseguiria engravidar, tinha certeza que meu corpo ia trapacear e dificultar a gravidez.
Bem, ele funcionou à contento, três vezes, sem nenhum tratamento fertilizante.
Mas a primeira vez é sempre aflitiva.
Será que vou conseguir cuidar de uma pessoa completamente dependente de mim?
Conseguirei entender suas necessidades?
Decifrarei seus choros, suas dores?
Esse choro seria dor de barriga, de ouvido, fome, sede, frio?
Insegurança teu nome é mãe!
E aí, de repente, sem aviso prévio, a criança nasce.
No meu caso, sem aviso mesmo, não senti nada. Dor, bolsa rompida, contrações ritmadas, nada.
Em nove meses, por três vezes, nenhum sinal de que elas estavam à caminho.
Evidente que fiquei feliz, ela estava bem, era perfeita, tinha dez dedos nas mãos, dez nos pés, nenhum problema físico, saúde perfeita e pulmão excelente.
Mas eu só havia parido, não era mãe, ainda.
Enquanto estava hospitalizada, tudo era fácil, só me ensinavam a amamentar, coisa pouca, já que ela devorava meus seios. Ainda assim, achava que não teria leite, que ela morreria desnutrida.
Mais uma vez, meu corpo me surpreendeu e me transformou em uma vaca leiteira. Amamentei todas elas e por longo tempo.
Mas seria isso, ser mãe?
Não era, não, isso era ser ama de leite, mas era menos uma insegurança. Eu era capaz de alimentar com meu leite.
Quando me vi só com minha cria foi que começou a aparecer a mãe.
E apareceu provocada pela criança que me colocava enigmas, vinte e quatro horas por dia.
Meus sentidos ficaram apurados, minha atenção era redobrada, meu tempo tomado, minha vida invadida. Bebê esgota, suga o seio e a existência. Mas aquela criança estava ali porque eu escolhi tê-la e precisava de mim pra cuidar dela, protegê-la, acarinhar seu corpinho indefeso, acalentar seu sono, remediar suas dores, confortar seu choro. E fui aprendendo a ser mãe.
Só agora entendo que instinto maternal é coisa de reino animal. Os humanos precisam se despojar de seus interesses, seu tempo, seu lazer, sua vida, por um grande tempo, talvez para sempre.
Não é abdicar de si, é viver com. O xis do problema é que humanos pensam e complicam.
Ser mãe é vocação, não adianta cobrar de quem não tem. Acho que deveria haver teste vocacional nessa escola, alguns desastres seriam evitados.
Quando me tornei mãe?
Evidente que não foi quando a primeira nasceu. Mas ela foi o bê a bá, foi meu dever de casa, em casa.
Me senti mãe quando não consegui me afastar dela, na primeira vez. Sai e voltei da porta, achava que ninguém iria entender o que ela queria, que só eu seria capaz de traduzir seu choro. Ledo engano. Era eu quem precisava dela, de tê-la ao meu lado. Precisava do que ela me dava, seu olhar, suas mãos agarrando meu seio, seu corpinho quente contra o meu. Entendi que não se nasce mãe, o amor é conquistado, oferecido e doado`. É uma via de mão dupla.
Ser mãe é um trabalho duro, nunca mais se dorme em paz, nunca mais se baixa a guarda, nunca mais se coloca em primeiro lugar. E, ainda assim, ama cada dia mais.
E minha vocação foi ficando mais forte, me descobri mãe.
A escola foi ficando mais complexa, mais desafiadora e eu mais aplicada.
Quando a segunda nasceu já me sentia mais segura, mesmo sendo diferente da primeira, era mais calma. Ou seria eu a ter mais tranquilidade? A terceira, me ensinou novas matérias, endiabrada, levada, arteira que era. Tive que inventar uma mãe pra cada.
São os filhos que nos dizem que mãe seremos, nos ensinam qual lição precisa ser mais estudada, qual dever deve ser mais aprofundado, são nossos orientadores.
Por isso não comemoro dia das mães, todo dia é nosso dia, todo dia é dia dos filhos que nos tornaram mães. Um não seria possível sem o outro.
Hoje, que Deus me ajude, tenho muitos filhos, de barriga e coração. Todo dia tenho um novo filho que agrego à minha extensa prole. 
Sou mãe em tempo integral, não porque preciso ser, mas porque gosto de ser. Adoro ser desafiada, ainda, pelos seus choros. Embora adultas, continuo na escola, ajudando a solucionar problemas, decifrando novos códigos, buscando alívio pra dores existenciais que parecem impossíveis de serem resolvidas.
E tenho meu lazer com elas, meu recreio, onde brincamos, rimos, nos divertimos juntas.
Minhas filhas me lapidaram, transformaram minha pedrinha sem valor em diamãete.
Feliz Dia das Mães. Feliz Diamãete.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

HOUSTON, TEMOS UM PROBLEMA!

- Não é você, sou eu.
E lá vamos nós.
Preparo meu traseiro pra levar o chute potente.
E ele vem, certeiro.
Me projeta pros quintos do inferno, sem piedade.
No espaço sideral em que me encontro só há o silêncio.
Nenhuma justificativa que me aponte uma resposta.
Não deve haver, mesmo. Deixa-se de gostar, acabou.
Estranho, não sinto a angústia de antes, que me apertava o peito, me tirava o sono, a fome.
As lágrimas sofridas e incontroláveis já não brotam em meus olhos.
De onde estou, experimento a claridade dos sentidos. Percebo, analiso. Enxergo acima dos motivos alegados.
Os rompimentos anteriores me calejaram, me ensinaram que não existe a incerteza do amanhã.
Por mais traumático que seja o hoje, o dia vai nascer sem levar em conta a noite que teima em ficar na alma. Embora se possa morrer de amor, e tem gente burra que, literalmente, morre de melancolia, o amanhã não percebe sua falta no mundo. A vida continua sem você, sem mim, sem qualquer um de nós. Aprendi que não se anula a dor, ela é como um hematoma que vai ser absorvido em seu devido tempo. Vai se desfazer e sumir dentro do meu corpo, se misturar às outras experiências que anoto em minha vida.
Lá, no alto em que você me atirou, percebo, com mais nitidez, os contornos e reentrâncias que limitavam minha visão.
Saí de órbita, como um foguete, pra perceber que sempre orbitei em volta de alguém. Andava em círculos, esperando proteger minhas fronteiras, achando que cercava com cuidados a pessoa que eu amava. Não via que corria atrás do próprio rabo, fechando meu mundo, fazendo com que nele habitasse só um ser e não era eu, era o outro.
Hoje sei que sou e sempre serei o número um, único, indivisível.
Mesmo estando rodeada por milhares, seremos milhares de um.
Não existe metade de laranja, alma gêmea, compatibilidade que mude isso.
Nascemos e morremos sós, e vivemos buscando o par. Não vai fazer a menor diferença essa procura. No final do dia, quando fechamos os olhos pra dormir, estamos sós.
Você foi mais uma tentativa de negar o número mágico.
Não se trata de me conformar com o fato de que sou só, é a constatação de que preciso ser feliz comigo e não depender de outro pra me fazer completa. Sou uma, sou única e devo me bastar.
Não preciso, ou não devo precisar, do olhar do outro pra existir. Quem quiser habitar meu mundo vai ter que aprender a viver ao lado e não dentro de mim. Aprendi a duras penas. mas aprendi.
- Houston, temos um problema!
E ele é imenso.
Estou voltando à terra, sei que posso me desintegrar se não fizer um pouso planejado e suave.
Preciso de um plano pra dar os passos que me trarão de volta.
Mas tenho fé em mim, vou pisar em terra firme e caminhar sobre meus próprios pés.
No fim, você me fez um favor.
Me fez enxergar, definitivamente, que meu solo não desaparece, que flutuar, de vez em quando, não me tira a certeza de que tenho meu chão, de que o ar que me envolve é tudo o que preciso pra me deslocar. Não preciso do outro pra existir, preciso de mim, inteira, única, uma.
Você estava errado quando deu a indefectível desculpa, porque não era você meu problema, era eu.
- Houston, terra à vista, pousando!